terça-feira, 25 de setembro de 2012

Ou isso ou aquilo

Paulo Werneck
Este é o nome de um poema de Cecília Meireles: "Ou Isto ou Aquilo"
Ou se tem chuva e não se tem sol
ou se tem sol e não se tem chuva!
Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se põe o anel e não se calça a luva!
Quem sobe nos ares não fica no chão,
quem fica no chão não sobe nos ares.
É uma grande pena que não se possa
estar ao mesmo tempo em dois lugares!
Ou guardo o dinheiro e não compro o doce,
ou compro o doce e gasto o dinheiro.
Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo...
e vivo escolhendo o dia inteiro!
Não sei se brinco, não sei se estudo,
se saio correndo ou fico tranqüilo.
Mas não consegui entender ainda
qual é melhor: se é isto ou aquilo.
Esse poema lembra o horror da classificação fiscal à dúvida: para uma mercadoria, um código ou outro!

Algumas mercadorias são de classificação muito simples, outras, ao contrário, desafiam a argúcia do classificador.

Por exemplo: uma mercadoria, mesmo incompleta, classifica-se como completa desde que apresente, no estado em que se encontra, as características essenciais do artigo completo. Imagine o leitor um automóvel abandonado na rua: até que ponto pode ser depenado sem mudar de classificação fiscal?

O instituto da consulta, pelo qual o interessado pode solicitar à Receita Federal que informe qual a classificação correta para uma mercadoria, é um instrumento que propicia segurança jurídica ao contribuinte, que passa a poder operar com tranquilidade.

Ocorre, entretanto, que às vezes o contribuinte não tem propriamente uma dúvida, mas uma preferência por uma determinada classificação, e faz a consulta para se acobertar; quando a resposta vem, e não é do seu agrado, tenta recorrer da decisão.

Não pode. A decisão, no caso, é irrecorrível e tem uma razão, expressa por Cecília Meireles: ou isto ou aquilo. Não podem ser utilizados dois códigos diferentes para uma dada mercadoria, seja esse código qual for. Interessa menos qual o código que seja utilizado consistentemente sempre o mesmo.

Daí a solução de divergência: se um contribuinte fez uma consulta numa região e obteve uma resposta, e outro noutra recebeu uma diferente, o caso sobe para Brasília que deve pacificar a questão. Depois, se se descobre que no Brasil se usa um código, e na Argentina, outro, a decisão passa a ser do Mercosul, que determinará qual o código a ser usado na região. Finalmente, se outro país de fora do bloco usa um código diferente, o caso sobe para a Organização Mundial das Aduanas que bate o martelo para o mundo inteiro.

Não interessa qual a escolha da OMA, interessa que não sejam aplicados dois códigos diferentes para a mesma mercadoria, seja onde for.

No meu livro "Como Classificar Mercadorias: Uma Abordagem Prática" apresento um caso que subiu até a OMA, que decidiu, a meu ver, de modo equivocado. Manterei o suspense - os interessados que leiam o livro e vejam quem tem razão, este escrevinhador, ou a comissão internacional de medalhões que bateu o martelo sobre o assunto, mas, mesmo que me dêem razão, utilizem o código definido pela OMA, que é o válido...

Isso explica porque a questão não está sujeita à interferência do Judiciário: não pode um juiz num lugar determinar o uso de um código, o outro juiz escolher um diferente: em todo o mundo deve ser usado o mesmo!